Equipes do INPE e da UFABC, associadas ao Centro, realizaram voos de drone para captar imagens de alta resolução em áreas vulneráveis a inundações, alagamentos e movimentos de massa. Trabalho de campo contou com apoio da Prefeitura e da Defesa Civil de Mauá
O Centro de Estudos da Favela (CEFAVELA-Cepid/Fapesp) está desenvolvendo uma plataforma pública que reunirá informações qualificadas sobre favelas e seu entorno, o Cubo de Dados para Favelas (BDC-Favelas). Nela, serão organizadas imagens desses territórios produzidas por diferentes tecnologias, que poderão ser acessadas de forma gratuita e aberta.
As primeiras imagens para a plataforma foram geradas por drones, em um trabalho de campo realizado nos dias 23 e 24 de abril na cidade de Mauá, situada na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), com pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e da Universidade Federal do ABC (UFABC), que integram o CEFAVELA.
A proposta do BDC-Favelas é organizar conjuntos de imagens de diferentes fontes – incluindo satélites brasileiros e internacionais, além de drones – com níveis variados de resolução, capazes de mostrar desde áreas mais amplas até detalhes com alta precisão. A plataforma é baseada no projeto Brazil Data Cube (BDC), do INPE.
O termo “cubo de dados” refere-se a uma estrutura que organiza grandes volumes de imagens espaciais de forma padronizada e contínua no tempo, permitindo analisar mudanças, comparar informações de diferentes períodos e extrair indicadores de maneira mais eficiente.
Os dados do BDC-Favelas serão armazenados e mantidos pelo INPE, em parceria com a UFABC – instituição sede do CEFAVELA, e poderão ser consultados por moradores, pesquisadores, gestores públicos, entidades da sociedade civil, entre outros públicos, assim que a plataforma estiver disponível.
O trabalho de campo realizado em Mauá foi viabilizado graças a uma parceria já existente entre pesquisadores que integram o CEFAVELA, a Prefeitura e o Ministério da Cidade em projetos desenvolvidos na região.
“Neste trabalho de campo, foram realizados registros com drones operados em diferentes altitudes, gerando diferentes tipos de imagens – RGB, multiespectrais e termais – com variadas resoluções espaciais. O objetivo foi tanto formar um conjunto de dados que sirva como protótipo para orientar campanhas de coleta, quanto avançar na elaboração de um protocolo para a coleta de dados em favelas”,
explica Isabel Escada, pesquisadora do CEFAVELA.
Uma das aplicações do Cubo de Dados para Favelas é apoiar o mapeamento das áreas de risco. As duas regiões selecionadas em conjunto com os pesquisadores e representantes do setor público para os voos em Mauá, por exemplo, são periféricas e expostas a riscos socioambientais. A Vila Carlina é uma área caracterizada por uma alta suscetibilidade à ocorrência de inundações e o Jardim Zaíra, já mapeado pela equipe da UFABC que trabalha em parceria com a Prefeitura Municipal e a Secretaria Nacional de Periferias na elaboração do Plano Municipal de Redução de Riscos de Mauá, apresenta vários setores caracterizados como de risco alto e muito alto à ocorrência de deslizamentos de terra.
O trabalho com drones em Mauá teve o objetivo de gerar dados preliminares e definir estratégias para missões de imageamento com drones em favelas, com vistas à criação de protocolos específicos para esse tipo de produção de dados no futuro. Para isso, a atividade promoveu a interação entre pesquisadores do CEFAVELA vinculados ao LiSS/LabDrones do INPE, coordenado por Isabel Escada e Sidnei Sant’Anna, pesquisadores da UFABC e atores locais.
As imagens capturadas também serão utilizadas para testes nos processos de integração da plataforma BDC-Favelas, atualmente em desenvolvimento no âmbito do CEFAVELA. O LiSS/LabDrones-INPE será responsável pela produção dos mosaicos das imagens dos voos realizados em Mauá e pela geração das ortofotos. Pela equipe do CEFAVELA-UFABC participou o pesquisador Christian Ricardo Ribeiro.
“A ortofoto é uma imagem aérea de alta precisão, corrigida geometricamente em um processo chamado de ortorretificação, no qual são eliminadas distorções causadas pela inclinação do terreno e por imperfeições relacionadas ao sistema de captura, como o próprio movimento do drone”,
explica ele.

Os drones utilizados geraram imagens com resolução espacial de aproximadamente três centímetros. Para efeito de comparação, as imagens orbitais obtidas por sensores a bordo de satélites como o Landsat tem resolução de 30 metros.
Também foram capturadas imagens utilizando sensores termais, que permitem analisar a exposição ao calor. Todos os objetos na superfície terrestre emitem radiação infravermelha, cuja intensidade e padrão variam de acordo com a temperatura do objeto. Com o uso desses sensores, é possível identificar áreas com diferentes níveis de temperatura. As informações geradas serão utilizadas por Rohit Juneja, pesquisador do CEFAVELA, que investiga os riscos associados à exposição a altas temperaturas em territórios de favelas.
“A UFABC já desenvolve estudos em Mauá, com o mapeamento das áreas de risco para a atualização do Plano Municipal de Redução de Riscos. Todos estes estudos são fundamentais para que Mauá tenha informações precisas sobre o seu território. Com isso, podemos elaborar políticas públicas que potencializem o atendimento e a qualidade de vida da nossa população”,
conclui Sérgio Moraes de Jesus, secretário de Proteção e Defesa Civil de Mauá.
Cubo de Dados para Favelas
O portal web público em que estará disponibilizada a plataforma funcionará como um visualizador interativo, por meio do qual se poderá explorar dados e, futuramente, associar informações adicionais sobre o território e seu entorno. Entre essas informações poderão estar mapeamentos de riscos ambientais – como enchentes, deslizamentos e ilhas de calor, que foram o foco do trabalho com os drones em Mauá -, infraestrutura urbana, cobertura do solo e outros indicadores de interesse público.
Um aspecto central do BDC-Favelas é seu caráter participativo e customizável.
“Como a plataforma é baseada em tecnologia nacional e pública, é possível discutir com cada comunidade como o território será representado e quais dados estarão disponíveis. Assim, as representações poderão ser co-produzidas, envolvendo moradores e lideranças locais na obtenção e disponibilização de imagens, na construção das cartografias e nas interpretações do território”,
destaca Antonio Miguel Vieira Monteiro, pesquisador do INPE e pesquisador principal do CEFAVELA, que está coordenando o projeto.
Trata-se, portanto, de uma ferramenta estratégica para o fortalecimento da soberania informacional dos territórios populares.
“Ao garantir que os dados sobre favelas sejam organizados, armazenados e utilizados de forma transparente e colaborativa, o BDC-favelas contribui para que essas populações tenham acesso qualificado a informações sobre seu espaço de vida, ampliando sua capacidade de diagnóstico, planejamento, reivindicação de direitos e defesa de seus territórios”,
completa Flávia Feitosa, coordenadora de Transferência de Tecnologia e pesquisadora principal do CEFAVELA.
Destaques da última edição: